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AVE BACO! É CARNAVAL
Todos os anos a expectativa é a mesma. Com o encerramento das comemorações de natal, a passagem das festas de réveillon e a entrada de um novo ano, o carioca permanece ávido pelos próximos dias de recesso, longe do ambiente rotineiro de trabalho e da permanente expressão de insatisfação do chefe.
E, é justamente com a chegada do carnaval, que este desejo atinge o ápice e, como na satisfação de um orgasmo, torna-se realidade. Época em que, a São Sebastião, padroeiro do Rio de Janeiro, resta apenas assistir suspenso à cidade à mercê inevitável das momísses de Baco e de suas ninfas inebriadas. Afinal, se Deus, ou melhor, Zeus é brasileiro, Baco é carioca.
Numa invocação coletiva ao deus do vinho, multidões são arrastadas às quadras e avenidas, agora convertidas em sagrados templos à exaltação dos prazeres da luxúria e da cevada, abundante nesta época.
A ausência de roupas e a exposição do corpo como um símbolo majestoso dão o prenúncio do que está por vir. Eis o momento do tributo ao símbolo maior do carnaval: a bunda. Sendo uma já em voga na TV, a festa melhora e a imprensa logo estampa na capa das revistas aquela que consigo carrega menos pano.
A folia atravessa as noites regida pelo bater incessante de tambores frenéticos durante quatro dias concecutivos. Após isso, alguns, ainda sob os efeitos da data, recusam-se a retornar às suas tarefas cotidianas, frequentando clubes de resistência ao fim do evento.
Mas, enfim, tudo parece voltar a ser como antes: os crimes, a corrupção política, a miséria, estarão novamente na telinha da TV. Os maiores absurdos sociais parecem ressurgir do nada, embora nunca tivessem deixado de existir (talvez estivessem de viagem, desfrutando o feriado).
Fato é que muitas das bundas cultuadas, certamente, serão esquecidas, cedendo lugar a outras talvez ainda mais polêmicas no próximos ano. Isto se, até lá, o alegre deus greco-carioca não for vítima de um sequestro relâmpago enquanto estacionar em um dos sinais de trânsito da cidade, ou, simplesmente, desaparecer enquanto retornar de um baile em um subúrbio carioca.
Pelo visto a violência e o crime organizado no Rio estão se tornando mais tradicionais que o próprio carnaval.
Haja vista tal situação, desde já, roguemos com todo fervor a São Sebastião para que nunca chegue o dia em que assistamos a Papai-Noel preso por pedofilia ou o Coelhinho da Páscoa autuado por tráfico de drogas, encontradas dentro de inocentes ovinhos de chocolate.
Texto : Fábio dos Santos Cézar, carioca, é professor, músico e poeta.
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