CARNAVAL
O carnaval na literatura de cordel

Os "ABCs" são uma modalidade da literatura de cordel muito antiga, dedicada a homenagear heróis e localidades, personagens e acontecimentos. "A função primitiva dos ABC devia ser mnemônica", informa Câmara Cascudo em "Vaqueiros e cantadores" (p. 70). A disposição das estrofes, cada uma iniciada por uma letra diferente, em sequência de dicionário, facilitaria a memorização dos versos.

O Carnaval é um tema de vasto cultivo na literatura de cordel do Nordeste brasileiro. Dois folhetos antigos, do tempo em que o Carnaval tinha "três dias": "O Carnaval da Bandalheira", do poeta-repórter José Gomes, Ele o Tal Cuíca de Santo Amaro (1907-1964), e "Um exemplo que se deu no Carnaval deste ano" (1954), de Manoel Camilo dos Santos. São folhetos que podem ser classificados como de crítica de costumes ou sátira:

"E assim é o Carnaval
Três dias de bandalheira
Três dias de orgia
Três dias de mulequeira
Três dias de pandemonio
Três dias de bebedeira"
(Cuíca de Santo Amaro, "O Carnaval da Bandalheira")

Um exemplo contemporâneo desse gênero de literatura de cordel que tem o Carnaval como tema central são as coberturas jornalísticas em forma de cordel do repórter-poeta Zezão Castro, registros em verso rimado dos Carnavais de 2004 e 2008 (salvo erro na datação), publicados em páginas especiais do jornal "A Tarde". Os dois cordéis-reportagem talvez sejam os únicos, nos tempos atuais, impressos no calor da hora em um veículo diário de grande circulação.


ABC DO CARNAVAL 1

"ABC do Carnaval", do alagoano radicado na Bahia Rodolfo Coelho Cavalcanti (1919-1986) é outro folheto que pode ser incluído na categoria de crítica ou sátira. O poeta usa a palavra para moralizar a sociedade, numa "luta contra a dissolução dos costumes e a desagregação moral" (na definição de Orígenes Lessa em nota introdutória à antologia "O cordel e os desmantelos do mundo", 1983, p. 13):

"Rua abaixo, rua acima
Vão 'marchando' os cordões
São 'blocos' e 'batucadas'
São grupos de fuliões!
Quantas almas decaidas?
Quantas mulheres perdidas
Neste mar das iluzões?"
(Rodolfo Coelho Cavalcanti, "ABC do Carnaval")

Publicado após o mesmo Carnaval em que a Fobica de Dodô e Osmar desfilou pela primeira vez (1950) e abriu alas para a capitalização da festa, o cordel de Rodolfo ironiza o Carnaval dos bailes nos clubes. Não chega a mencionar as recentíssimas invenções da guitarra baiana ou do trio elétrico, que a partir daí renovaram o Carnaval de rua.


ABC DO CARNAVAL 2

É nessa tradição que se insere meu "ABC do Carnaval" (Edições K, 2009). Porém estamos em outros tempos, os costumes mudaram muito, o Carnaval se industrializou e agora tem "sete dias", conforme hiperboliza meu folheto. O Carnaval se tornou um dos símbolos da identidade coletiva do povo de Salvador. Mesmo com a mediocridade musical reinante, existe música de qualidade no trios elétricos. Mesmo com o agravamento do problema da privatização do espaço público durante os desfiles, o Carnaval é a hora em que o povo sai às ruas e reocupa seu território, com a graça da arte ou com a dor da violência. Meu "ABC do Carnaval" enaltece uma cidade que por alguns dias se transforma em uma festa.
( ABC DO CARNAVAL - Wladimir Cazé - 14 páginas - R$ 3,00 )
Vendas (71) 8890-6545


Texto : Silva Horrida



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