Podemos começar?
Espera. Quero fazer a primeira pergunta. Você se importa se a entrevista for acompanhada pelos meus seguidores no Twitter?
Quantas pessoas estão aí com você?
Quinze mil, por aí. O Twitter é uma ferramenta mais recente, estamos crescendo. Mas a minha comunidade no Orkut, entre os artistas, é a maior do Brasil. São quase 600 mil usuários cadastrados. Também estou no Facebook e no MySpace.
O perigo é que aí deixa de ser uma entrevista exclusiva e passa a ser uma coletiva.
Não (levando a sério)! Só você fará as perguntas, eles ficarão apenas acompanhando e fazendo comentários que vão aparecer aqui na tela. (Ela vira o computador e mostra dezenas de manifestações de fãs correndo pela tela. Muitas com o mesmo texto: “Eu te amo!”)
Talvez você possa deixar o computador ligado apenas no começo da entrevista e depois desligá-lo (descem na tela diversas aprovações por parte dos seguidores). O Twitter hoje faz parte do seu show?
Estou totalmente viciada. A internet sempre foi um dos grandes apoios do meu trabalho. Mas por culpa do Twitter tenho passado mais horas moitando na frente do computador. É impossível interagir com todos os meus seguidores, mas respondo a uma ou outra pergunta e continuo escrevendo textos mais longos no meu blog. Muitos internautas são bem jovens e às vezes escrevem bem errado (risos). Eu não perdoo e corrijo (continua rindo). Meu incomoda ler “chato” e “bicho” escritos com x (vários seguidores fazem agora a mesma provocação: “xata”). Desaprovo até o abuso das abreviações. Fazer isso o tempo todo banaliza e empobrece a língua.
Os seus textos no blog costumam ser bem escritos e pontuados, sem muitas concessões ao “internetiquês”. Você tem realmente apreço pela gramática?
Muito. E também pela literatura. Adoro Clarice Lispector e Fernando Pessoa. Do Pessoa, gosto de Alberto Caieiro, o “homem do campo” (a repórter o confunde com Álvaro de Campos, o heterônimo do engenheiro, e Claudia Leitte prontamente faz a retificação). Outro dia, um crítico de uma conhecida revista perguntou se eu estava dando essa declaração só para fazer bonito. Perguntei se ele estava me achando burra. Ainda existe muito preconceito com quem canta axé. Mas parei de me preocupar com a crítica e nem sempre leio o que escrevem sobre mim. Meus fãs são o meu melhor termômetro.
Hoje a sua família está envolvida na administração da sua carreira. Como aconteceu?
Foi natural. Pela própria formação, meu pai passou a cuidar dos contratos e da parte administrativa, com a minha irmã (Flavia, 36). Meu irmão (Cláudio Jr., 26) se tornou o responsável pelo conteúdo de internet. Já minha mãe continuava dando aula em escola pública, mas passou a ter problemas quando a minha carreira deslanchou. Um traficante ficava mandando recado, chamando-a de “mãe do Babado”. Não dava para continuar. Hoje, como minha contadora, ela é tenebrosa. E meu marido, que como meu pai se formou em administração, virou um dos meus três empresários, ao lado dos meus sócios, Marcos e Cal. Se melhorar, estraga.
Como foi o seu reencontro e casamento com uma paixão antiga?
Foi em 2005, quando eu ainda era do Babado Novo e começava a ficar conhecida na Bahia. Um dia, eu estava com três amigas de infância numa creperia de Salvador chorando as mágoas de um antigo namoro. Márcio chamou a minha atenção assim que entrou. Eu ainda não tinha me dado conta de que ele era o mesmo garoto por quem eu tinha sido apaixonada na 6a série, e estava dando mole para mim, mas era monossilábico. No fundo, estava morrendo de medo de que ele me achasse oferecida. Para piorar, alguns dias depois, eu caí quando fui entrar na caminhonete dele. Estava meio “trilili” por ter tomado três taças de vinho. Mal me levantei e já fui avisando que não era oferecida. Ele me respondeu: “E quem disse que eu estou a fim de você?” Aquilo me desmontou. Pouco depois, ele parou num posto de gasolina e me deu o melhor beijo da minha vida. Continuamos conversando pela internet – ele escrevia um diacho de texto perfeito! Brinquei que, para namorar comigo, tinha que assinar um contrato. Ele me respondeu assim: “Prezada cliente, solicito que este seja vitalício”.
Você disse que a sua música também representa um canal de ajuda espiritual. Como funciona isso?
O que acontece por meio da minha música ajuda, sim, algumas pessoas. Sempre procuro passar boas mensagens. Só me envolvo em campanhas nas quais acredito, a favor da amamentação e contra as drogas, por exemplo. O título do CD que lanço depois do Carnaval, Sette, foi inspirado num versículo bíblico, em Mateus 7, que diz que antes de julgar os outros devemos olhar para as próprias atitudes. Tenho cada vez mais interesse por temas ligados à espiritualidade. Comecei a estudar direito, depois comunicação, mas não concluí nenhum dos cursos. Penso agora em fazer faculdade de teologia pela internet.
A religião é parte muito importante da sua vida, então?
Religião, não. Mas Deus é. Nunca pensei que a gente fosse fruto de poeira cósmica. Já recebi alguns sinais divinos na vida. A última intervenção de Deus, que acho que tive, foi há poucos meses. Eu estava gravando o programa do Luciano Huck, no Rio, quando me senti avisada de que deveria levar rapidamente meu filho, Davi, ao hospital. Parei tudo e dei ouvidos a essa intervenção de Deus. Davi foi diagnosticado com meningite. Nunca sofri tanto na vida. Felizmente ele se recuperou.
Você se sentiu muito suscetível a julgamentos naquele momento?
Demais (faz pausa para, em seguida, revelar que o assunto ainda a emociona). Teve gente que me julgou e disse que a doença foi provocada pelas minhas turnês. Mas o meu filho fica em casa. Só viajo com ele de avião fretado. Nunca viu multidões nem esteve no meu camarim.
O que está achando da experiência de ser mãe?
É maravilhosa. Parece que a vida faz mais sentido. Eu quero ter mais filhos porque nasci mesmo para ser mãe. Tanta empolgação com a família pode estar ligada ao modelo familiar positivo que conheci na infância. Sempre fomos muito unidos. Minha mãe (Ilna, professora, 51 anos) é baiana e conheceu meu pai (Cláudio, administrador de empresas, 53) pedindo carona na volta da praia em Salvador. Na época, era comum as pessoas se conhecerem assim. Meu pai é carioca, mas morava em São Paulo. Eles namoraram por correspondência durante oito meses antes de casar. Foram morar em São Paulo quando mamãe engravidou, mas ela não se adaptou. Era para eu ter nascido em Salvador. Só que ela sofreu uma ruptura de bolsa e desceu na escala do Rio. Meu tio tinha uma clínica em São Gonçalo, e meu pai voou de carro para lá. Na travessia da ponte Rio-Niterói, ele discutiu com um guarda que parou o carro por excesso de velocidade. Meu nascimento foi conturbado, mas a minha infância foi tranquila. Com cinco dias de vida, fui para Salvador. Vivemos lá até hoje.
OS BASTIDORES DO SHOW
Foi o “Pai Nosso” mais animado de que já participei. De mãos dadas com Claudia Leitte, seus músicos e bailarinos, fiz parte da oração minutos antes de a cantora subir no palco. Alguns batiam os pés enquanto rezavam em ritmo de aquecimento pré-show. Em seguida, fui convocada, como os demais participantes, a deixar uma “mensagem” ali mesmo no camarim. Meio sem jeito, disse algo como “tomara que vocês produzam hoje bastante endorfina”. Os integrantes do show agradeceram aos céus e pediram paz no mundo. Claudia Leitte escolheu a seguinte mensagem para arrematar seu ritual: “Espero que vocês não saiam daqui achando que são o máximo. Não se iludam, o sucesso é passageiro. Vão dormir apenas sendo o que são”. Mas na volta do show, que terminou por volta de 1 da manhã, nem foi preciso lembrar do conselho da artista. Depois de duas horas tocando, dançando e pulando, os artistas simplesmente desmaiaram no ônibus. Claudia Leitte continuava acesa, mas, seguindo orientação da assessoria da cantora, não puxei conversa com ela após o show: no dia seguinte Claudia se apresentaria no Rio e precisava descansar e preservar a voz.
Nossa aventura havia começado seis horas antes, com a entrevista em São Paulo, e continuou na van rumo a São José dos Campos, onde ela retomou um show cancelado por causa da meningite do filho. Entre os passageiros estavam o marido e empresário, Marcos Pereira, o estilista Walério Araújo, a fonaudióloga Regina Grangeiro e a ex-cabeleireira Zizi Santana, hoje transformada em uma de suas fiéis produtoras. Viajamos assistindo a PU 239, filme de Scott Z. Burns sobre o funcionário de uma usina nuclear que sofre um acidente radioativo. A cantora prestava atenção a tudo. Fazia exercícios de aquecimento com a fonaudióloga e, ao mesmo tempo, acompanhava o enredo. De vez em quando, repetia as frases para treinar o inglês. Foi durante o trajeto que a cantora também explicou mais detalhadamente a ideia de dar ao novo CD o título “Sette”, mas com dois “t” para combinar com o sobrenome Leitte. “É por causa de Mateus 7, versículos 1 a 7. A essência desse ensinamento é que, antes de julgar os outros, temos de olhar para nós mesmos.” Claudia disse ter uma “relação mágica” com o número, que é o dia de aniversário do pai (7 de agosto) e o mês do dela (10 de julho).
Em São José dos Campos, Claudia cumpriu sorridente o protocolo pré-show, que inclui receber jornalistas e alguns convidados do contratante. Deu nove rápidas minientrevistas exclusivas e atendeu reduzidos grupos de fãs. Três adolescentes tiraram fotos, abraçaram a artista e saíram da sala às lágrimas. A enfermeira Fernanda Fernandes, 26, levou a filha Isabella, de 5, para ser fotografada no colo da artista. “Claudinha é o ar que a minha filha respira”, disse a mãe, enquanto Isabella saia do camarim cantarolando “Bolha de Sabão”. Na primeira fila, a mesma menina assoprava as bolhas que os fãs espalharam pela plateia enquanto tocava a música. Como de hábito, Claudia estava eletrizada e parecendo ter o diabo no corpo. Mas era Deus que ela dizia levar o tempo todo no coração.
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