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Resgate da trajetória do trio elétgrico





Pesquisadora Lilian Cristina Marcon
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Da artesanal fobica ao potente trio elétrico
Invenção de Dodô e Osmar começou despretensiosa e evoluiu para uma complexa máquina tecnológica

A fobica trafegava lentamente. Dentro do carro, Dodô e Osmar tocavam frevos e marchinhas, com seus paus elétricos. Osmar estava preocupado em não atrapalhar o cortejo dos blocos na Rua Chile. Ele virou para Dodô e disse: "Rapaz, tô com medo que a gente seja preso por causa da confusão". Os dois decidiram pedir ao motorista que parasse o carro e foi quando ouviram do condutor uma resposta emblemática. "Já estamos sem freio e sem embreagem há muito tempo. Quem está empurrando o carro é a multidão". Era o domingo de Carnaval de 1950. O dia em que a Bahia conheceu o embrião do trio elétrico.

"Eu peguei eles na Castro Alves, já com muita gente seguindo. Quando chegamos ao pé da ladeira que subia para a Rua Chile, a fobica quebrou", lembra Orlando Tapajós, que depois veio a ser dono do trio Tapajós e hoje é uma lenda viva do Carnaval baiano. Mesmo quebrada, a fobica só parou na Praça da Sé.

Dupla elétrica - A idéia de usar a fobica no Carnaval surgiu durante uma apresentação do conjunto pernambucano Vassourinhas, um naipe de metais que até hoje percorre as ruas de Recife, tocando frevo. De passagem por Salvador, o grupo deu uma canja no centro da cidade, arrastando milhares de pessoas e impressionando Dodô e Osmar.

Como não dava para carregar toda a aparelhagem a pé, a dupla baiana instalou uma bateria no Ford T, modelo 1929, que Osmar usava no transporte de material para a sua metalúrgica. O carro também era conhecido como Ford "bigode" por conta da semelhança causada pelas marchas acopladas nos dois lados do volante. A bateria alimentava o amplificador, no qual estavam plugados os dois paus elétricos.

O som saía de duas cornetas, uma na frente e outra atrás. Numa faixa na parte externa, estava escrito: "A dupla elétrica". No chão, um grupo de músicos tocava caixa, surdo, bumbo, pandeiro e prato, acompanhando a marcha lenta da fobica.

Nesta época, o Carnaval de Salvador tinha perdido seu caráter popular e a festa no centro era um desfile de fantasias suntuosas, ao som de marchinhas lentas, assistido pelas pessoas nas calçadas. Muitas levavam cadeiras para descansar entre a passagem de um bloco e outro. Neste contexto, a visão do velho calhambeque, com dois jovens tocando instrumentos esquisitos, foi uma experiência memorável. Quem gostou, guardou o banco e seguiu a fobica. E o Carnaval nunca mais foi o mesmo.

Hoje, quem vê pela primeira vez um trio elétrico em ação se impressiona com o poder da máquina. Dezenas de caixas de som e amplificadores despejam agudos e graves pelas ruas.

Se alguém chegar perto, dá até para sentir as ondas sonoras com o corpo. A experiência é impactante. Tanto quanto deve ter sido para os foliões que, em 1950, ouviram pela primeira vez os sons amplificados dos paus elétricos. São duas imagens extremas que ilustram a evolução de uma técnica de construção marcada pelo pionerismo e pela criatividade, que se estendeu pelos últimos 50 Carnavais, sendo recriada a cada novo fevereiro.


Fonte: Gil Maciel, Correio da Bahia - Janeiro 2000


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